segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Notas moralistas

As presentes notas serão, temos certeza, taxadas por muitos que lêem este artigo como “moralistas”, como “frutos de um tempo passado”, como uma busca de regras sob um falso moralismo burguês, imposto verticalmente por uma classe que se pretende dominadora. Não é nada disso. São sim frutos de dupla face: por um lado, de criação, daquelas idéias que nos são incutidas ainda na infância, e pelas quais buscamos o respeito e o cumprimento. Por outro lado, são apenas constatações, que não se pretendem definitivas, muito menos almejam a uma resposta verdadeira.

As telenovelas são no Brasil um poderoso veiculo de difusão de idéias e comportamentos. São sempre alvos de críticas por parte de estudiosos que verificam em sua essência a presença da indústria cultural, que estaria disposta a vender e massificar padrões de pensamento e de consumo, de forma a alimentar a máquina capitalista. Sob sua máscara de diversão fútil, esconder-se-ia um poderoso elemento ideológico, disposto a infantilizar as mentes dos mais desavisados.

Entretanto, acreditamos que as telenovelas cumprem um importante papel social, ao colocar em discussão os mais prementes temas de nossa atualidade, os quais muitas vezes não recebem o tratamento adequado, mas que lançam as sementes para uma posterior discussão, desde que haja a preocupação em se buscar subsídios para tanto. Verificamos como exemplos as vezes nas quais foram tematizados a Síndrome de Down, a homossexualidade, o alcoolismo, a esquizofrenia, entre outros assuntos. Enredados na trama das telenovelas, tais assuntos levantaram as questões para o público que, embora muitas vezes possuísse algum conhecimento sobre o tema, puderam acompanhar estas “realidades” em seu momento de descanso.

A partir desta questão, verificamos uma outra questão a ser debatida. Exibe-se na Rede Globo, no horário das nove da noite, a telenovela Viver a Vida, de autoria de Manoel Carlos. Este autor destaca-se por sua longa lista de produções, que abrangem um período iniciado em 1952, na TV Excelsior. Em suas outras tramas, já abarcou diversos outros temas, como o bissexualismo, o jogo do bicho, a vida ao redor dos doentes de câncer, proporcionando uma visibilidade às discussões. Sua atual produção, porém, envereda-se por um caminho tortuoso.

Um dos pontos de relevo na condução da trama é a infidelidade, esboçada desde o início da novela e que, com o decorrer dos capítulos, ganha cada vez mais presença no roteiro. Onde está a problemática? Vivemos em uma sociedade eminentemente cristã, seja quais forem as suas diversas denominações. Somos criados, desde a tenra infância, com base em determinados princípios que condenam tal comportamento ao demonstra-lo como contrário as determinações de Deus. Percebemos o valor e a ênfase dada à família no discurso cristão, e cada vez mais notamos a desagregação desta instituição nos dias hodiernos.

Para além desta discussão (a qual não é objeto para esse espaço), há outros aspectos a serem abordados. Quando nos referimos à infidelidade, pensamos, em primeiro lugar, na questão do respeito ao outro. Em nosso tempo, não sejamos hipócritas: há uma ditadura do presente, um imediatismo que perpassa todas as instâncias de nossa vivência. Desta maneira, o respeito aos demais parece diluir-se em um comodismo do instante: muitas vezes esquece-se o que já foi feito por alguém em virtude do desagrado momentâneo, e isto é razão para que outros comportamentos sejam aceitos como válidos.

Somado a este aspecto, enveredamos ainda por outro caminho. As preocupações presentes, refletidas, por exemplo, no âmbito escolar, remetem cada vez mais a uma necessidade do compromisso com aquilo com o que nos propomos a fazer. Somos instados, em diferentes momentos, a “vestirmos a camisa” de uma causa, de uma instituição, a “abraçar a ideia” de um projeto. Recebemos o estímulo cada vez maior à noção de compromisso. Tristemente, este pensar em voz alta percebe na atual telenovela uma naturalização deste comportamento contrário. A infidelidade é trabalhada de uma maneira pela qual o público, muitas vezes, torce para que a mulher ou o homem fique com o amante. Os compromissos assumidos são deixados de lado para a consecução do momento, para que se busque a felicidade, mesmo que isso despreze o anteriormente construído. Dessa forma, indagamos: onde estão o respeito e o cumprimento do compromisso? Perdemos definitivamente a crença no valor da família, e de sua função? Não, não é errado buscar a felicidade, mas essa parece ser feita a qualquer custo, no qual o individualismo é gritante, onde o “eu mesmo” pesa mais que o sentimento da solidariedade e da honra à palavra empenhada, mesmo que de forma velada.

domingo, 13 de maio de 2007

O novo herói nacional

A visita do papa Bento XVI ao Brasil nesta semana trouxe um novo ânimo à fé do povo brasileiro, o qual parece precisar mais de apoio divino do que nunca, já que as soluções imediatas, advindas da prática política, parecem sempre se debater no plano da ineficiência e da desonestidade. No entanto, esta vinda ao país do sumo pontífice suscita outras questões, as quais não devem passar em branco e que ajudam a compreender diversos pontos que são fundamentais no caráter do brasileiro. Em primeiro lugar, a visita do papa deve concretizar o processo de canonização de Frei Galvão, tornando-o o primeiro santo brasileiro. Gesto de grande peso, uma vez que este acontecimento vai criar um maior sentimento de identificação entre os devotos do beato. No entanto, este episódio nos alerta para algo mais grave: a necessidade, não satisfeita entre o povo, de possuir seus heróis. Há sempre um clamor em torno das cerimônias do Oscar, do prêmio Nobel, ou mesmo do processo de canonização, no qual esperamos ‘‘qual será o primeiro brasileiro a se tornar...?’’. Precisamos destes tipos de heróis? Talvez não, uma vez que heróis já os temos vários, embora nossa memória coletiva seja pródiga em esquecê-los e lembrar apenas das datas comemorativas, já que estas se tornaram feriados. Mas nos esquecemos da essência destes festejos, como o do 21 de abril, quando foi executado o líder da primeira revolta que visava separar o Brasil de Portugal, ou o 7 de setembro, quando conseguimos nossa independência política. Em que pesem as considerações infinitas sobre o real significado destes personagens, parece que sempre estamos a nos afastar deles, tendo a necessidade de construir novos heróis, novos mitos que guiem nossas existências. É este vazio de significado que parece assolar o brasileiro, sem memória, sem história. Talvez este processo sobre Frei Galvão de fato gere um novo sentimento de pertencimento a nosso povo, que anda desiludido e sem rumos. No país no qual o exemplo que vem de cima nos mostra que a corrupção e desonestidade sempre se saem melhor do que o trabalho árduo e a justiça, talvez a reafirmação de nossa fé católica, através da canonização do ilustre personagem, sirva de lição, e que nos dê aquilo que ainda não devemos perder: a esperança de dias mais justos e melhores.
Publicado no dia 09 de Maio de 2007, no jornal Folha de Londrina

domingo, 4 de março de 2007

Breve ensaio sobre a cegueira

Por que indignação? A cegueira da fé insensata sempre conduz a caminhos errôneos. E é esta a paisagem que se desenha no debate aberto pelo senhor Walmor Macarini, quando da publicação de seu texto “O apego dos fanáticos”. O caro jornalista apontava para um dos caminhos a serem seguidos diante de um mundo cada vez mais individualizado e egoísta, no qual o homem se sente confuso e perdido. Não concordo com o colega quando o mesmo diz que a perda da fé causou isto; esse é um processo bem mais complexo, no qual, aos poucos, o homem foi sendo privado do entendimento do funcionamento do mundo, e perdeu a capacidade de modificá-lo, passando a ser quase um mero espectador.
Da época da Revolução Industrial, notamos que o trabalhador vai perdendo o controle sobre o processo de produção e torna-se apenas operário, aquele que opera a máquina cujo produto final agora desconhece na totalidade. Em um mundo gerido pela necessidade de produção e eficiência, é importante ressaltarmos também este alijamento.
No entanto, o corporativismo da fé do senhor padre, que se mostrou indignado em sua publicação no último dia 27 de fevereiro, nos mostra que a Igreja católica ainda pretende manter sua posição de intérprete final do ensinamento de Jesus. Como o sr. Bedrowski mesmo citou, segundo o evangelho de João, Jesus diz que ninguém vai ao Pai senão por ele, ou seja, através do entendimento de seu exemplo e de sua divindade, mas não estabelece o monopólio da crença na Igreja católica.
Lutero já havia afirmado que o homem é o sacerdote universal, ou seja, que pode ele mesmo ser seu sacerdote; ele mesmo possui o dom de interpretar e buscar as respostas mediante seu estudo e seu entendimento. Acredito também que, quando se anuncia a revisita de Jesus, é enquanto princípio, ou seja, quando o homem for capaz de desenvolver aquela centelha divina que carrega, então o momento do retorno do Cristo será confirmado. No entanto, a cegueira da fé insensata nos diz que há somente um abrigo, o do conforto da Igreja, com seus ministros infalíveis, e que não suportam a crítica e a opinião diversa.
Novas discussões se abrem com o anúncio da descoberta de uma suposta tumba com os restos mortais de Jesus e Maria Madalena. Haveria nisso alguma verdade? Talvez, uma vez que deveríamos diferenciar o Jesus histórico, o pregador que lutou contra a opressão dos sacerdotes judeus, e o Jesus princípio, aquele no qual o homem deve se espelhar e organizar sua vida. Mas, uma vez mais, veremos os brados furiosos dos entorpecidos pelo veneno da irrazão e do poder, para os quais há somente uma verdade.



Publicado na Folha de Londrina, no dia 01 de Março de 2007

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Que civilização?

O que é a violência?
Infelizmente, constatamos a cada dia que nos acostumamos a um estado de coisas lastimável. Hoje, foi discutido na Câmara dos Deputados o projeto que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. Graças a Deus (?), não foi votado.
Ah meus caros congressistas, você não entendem nem a dimensão do problema. Como tornar real uma ilusão jurídica, como se de fato modificar a lei fosse alterar em algo a situação vigente. E a excelentíssima presidente do Superior Tribunal de Justiça, doutora Ellen Gracie, nos diz que não podemos nos levar pela emoção, aprovando ou modificando leis em momentos de grande comoção.
A obtusa juíza pressupõe que, passado o horror no qual estamos mergulhados agora, em virtude do assassinato covarde e brutal de João Hélio, haverá novamente um período de normalidade, no qual o hábito da civilização voltará a imperar, com carros parando para os pedestres cruzarem as ruas, os mais novos levantando-se e dando o lugar no ônibus aos mais velhos, todos dizendo "por favor" e "obrigado".
Voltamos à normalidade sim; na madrugada de hoje, o vice-presidente da Escola de Samba Salgueiro foi fuzilado junto à sua esposa, após um dia de enorme tiroteio entre policiais e traficantes no Morro do Alemão.
Realmente, tudo está normal: 6 pessoas morreram na favela, mas afinal eles nem devem fazer falta. Já eram marginalizados e estavam tolhidos de sua dignidade, morando em condições sub-humanas e trabalhando por salários miseráveis, assim como aqueles policiais que combatiam os Robin Wood´s do morro.
Perdemos a noção do que seja a violência; e ainda chamamos Hitler de bárbaro.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Só para lembrar de um velho ídolo

Há três anos iniciei meus estudos de pós-graduação, e m e decidi por estudar um assunto muito discutido, mas que sempre deve estar na pauta de discussão: as conformações políticas existentes na Europa no início do século XX, em especial no caso do fascismo italiano.
O fascismo marcou-se por ser um movimento anti-classista, anti-parlamentar, anti-democrático, anti-comunista; baseado na idéia da "comunidade de destino", voltou-se para a idéia da reconquista do povo, já esgotado das soluções políticas aristocráticas e liberais, e que também olhavam com profunda desconfiança o modismo mal-arrumado que se disseminava no Leste.
No entanto, grande parte da literatura voltada às análises do fascismo foi feita por marxólogos que pareciam querer dizer "Olha lá, tá vendo do que a direita é capaz?", sempre abstraindo do maior exemplo da barbárie civil do século XX, o regime stalinista soviético, DE CONOTAÇÃO E INSPIRAÇÃO MARXISTAS.
Mas enfim, como hoje não estou com disposição de falar e escrever muito, enquanto lia, me lembrei de uma velha frase do velho polemista (e meu ídolo) Paulo Francis:
"O melhor discurso anti-comunista é deixar um comunista falar".

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

Da Barbárie


O recente acontecimento no Rio de Janeiro, com bandidos que roubaram um carro e arrastaram um menino de 6 anos preso pelo cinto de segurança, por vários quilômetros, me fez repensar o próprio conceito de sociedade.
Criou-se o Estado para que os homens, dentro de um ambiente de segurança, pudessem exercer o máximo de sua liberdade, entendida esta como a possibilidade de se realizar ações que visando a um fim benéfico, também não tolham a liberdade alheia.
No entanto, cada vez que um acontecimento destes vem a tona, nos perguntamos como devemos punir os criminosos, o que deve ser feito para coibir a violência. Logicamente, os juristas de plantão (e politiqueiros oportunistas) falam da redução da maioridade penal, e das formas como devem ser punidos os adolescentes que desrespeitem as regras de convivência (e no nosso caso, o próprio respeito pela humanidade).
Será esta a forma de punir quem comete o crime? Em minha opinião, parte-se de um princípio duvidoso: existe uma idade a partir da qual se está propenso a delinquir? Não seria mais justo abolir a maioridade penal e tornar TODOS responsáveis, civil e criminalmente, por seus atos?
Uma vez que temos pais cada vez mais omissos e ausentes em relação à educação de seus filhos, não seria mais justo deixar que a sociedade os julgue então? Não seria melhor os representantes do povo investir seriamente na educação e pararem de construir presídios federais, com os quais, no ano de 2007, serão gastos 46 milhões de reais somente EM MANUTENÇÃO, ou seja, para alimentar e deixar encarcerados os infratores?
Não seria o caso de repensar o próprio teor das nossos propagandas, que bombardeiam a cabeça dos jovens com as mensagens de "consumo = felicidade", uma vez que não se dá condições a todos de consumir? O consumo em si não é o problema, uma vez que esta oportunidade seja dada a todos.
A continuidade das falácias de nossos governantes e a inação deste povo cada vez mais ignorante é que nos brinda com estes absurdos, com os quais apenas fazemos cara de indignados, e esperamos pacientemente pela novela, com capítulo inédito a seguir.